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24.08.06 – A nova teogonia – 4ª Parte: Hades, Zeus, Éris, Juízes do Inferno, Fúrias, Thanatos e Hypnos, Perséfone

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Vide 3ª Parte

No Hades, o inferno grego, Hades, o soberano, chegou furioso.

Após ter sido atingido pelo raio de Zeus, acuado por estar no reino do irmão caçula, sem seus exércitos, e com uma dor profunda no coração por ter ferido duas vezes na mesma noite a amada Perséfone – pensamento e sentimento de culpa que o deixava fraco – rumou para o submundo. A cada segundo que passava a angústia piorava. Aquele pequeno corte feito em Perséfone, levaria a bela a sentir dores excruciantes e perder a doce e perfeita beleza que ostentava e que fazia o submundo um lugar aprazível e feliz. O que seria feito dela? Teria que voltar para salvá-la! Ninguém mais poderia ajudá-la. Mas Zeus, o maldito Zeus. Deméter… Será que tudo não passara de um plano para tirar Perséfone dele?

Conforme pensava em hipóteses e mais hipóteses, o voo de Hades tornava-se cada vez mais rápido. Desceu à terra como um míssil e a atravessou a toda velocidade, causando uma grande onda de impacto que varreu todo o entorno por quilômetros de distância,  deixando uma enorme cratera no chão, e logo entrou pelo céu do Hades, o inferno, em altíssima velocidade, dirigindo-se ao palácio. Passou voando rente ao rio Estige, lançando imensas colunas de água para todos os lados. O efeito do voo rasante e nervoso de Hades sobre a terra era similar. A terra negra simplesmente era rasgada e as almas, soldados e criaturas que estavam perto eram pulverizadas ou lançadas a centenas de metros ou simplesmente cortadas ao meio em razão da forte onda de impacto. Sobre o solo do inferno grego foram formados vastos sulcos que indicavam o trajeto que o deus do submundo havia traçado.

Hades chegou no castelo arrebatando todas as portas e portões possíveis. No salão principal aterrissou. Quando pousou fez um grande buraco no chão. Todas as vidraças foram estilhaçadas, os objetos, livros, cálices, quadros, cortinas, caíram de seus locais de repouso. Hades gritou enquanto deixava cair a manta negra fustigada que cobria seu corpo. O urro do deus ecoou por todo o submundo e chegou, tênue, ao próprio Olimpo. A aura negra da divindade furiosa cobriu todo o seu reino e criou uma película sobre ele, de forma a protegê-lo dos olhos e espiões do Olimpo. Horas depois, Thanatos, Hypnos, as fúrias e Cérbero chegaram aos domínios do negrume. Dirigiram-se diretamente para o castelo do soberano e lá encontraram Hades e os três juízes do inferno: Radamanto, Minos e Eáco.

O inferno estava em alerta.

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25.08.06 – Começa a formulação da vingança.

- MALDITO ZEUS!!!!!!!!!!! AAAAAHHHHHH!!!!!! – gritou furioso Hades no meio de seu salão destruído. Não havia dormido naquela noite. Aliás ninguém havia.

Cérbero se encolheu todo e colocou as patas sobre as duas cabeças laterais. A do meio estava com um olho fechado e o outro de soslaio. As fúrias, ou erínias (Tisifone, Alecto e Megera), olhavam para o chão, preocupadas com o estado de ânimo do líder, mas ao mesmo tempo alegres. Eram muito mal vistas pelos habitantes do Olimpo e, talvez por isso, os odiava. Para elas, aquela separação abrupta de Hades e Zeus evitaria contato com aqueles esnobes dos céus. Tanatos, Hypnos e os juízes do submundo olhavam impassíveis a manifestação de fúria de seu líder.

- Roubou minha amada esposa! Perséfone é minha!!! Eu a amo. – caiu aos prantos. Estava fora de si. Ainda sofrendo com a perda repentina. – Eu não devia… eu não devia. Perséfone, desculpe-me. – falou baixo o soberano – Eu não queria ter lhe batido. Como será que ela está? – perguntou para si mesmo em voz alta – Minha espada a feriu. Só eu posso salvá-la do meu próprio golpe. Preciso voltar ao Olimpo… Mas ela, Adônis…

Hades andava de um lado para o outro, confuso. Não poderia voltar mais para o Olimpo. Zeus não o aceitaria. Fora quebrada uma lei milenar dos deuses gregos, a de que o senhor do templo é soberano dentro dele. Hades desrespeitara o irmão na frente de todos e dentro da casa de Zeus. Entre os deuses esse era um dos maiores ultrajes que havia. Por outro lado, o esposo de Perséfone jamais toleraria alguém que tentasse tirá-la dele. Perséfone era tudo, era a razão de viver do irmão mais velho de Zeus. Para Hades, alguém arrebatá-la do inferno era o maior crime que poderia ser cometido. Zeus não permitiria que sua filha voltasse para as mãos do irmão. Mas ao mesmo tempo que o ódio pelo olimpiano crescia, a dor e o arrependimento cresciam em igual escala no coração do soberano. Não devia ter dado aquele tapa na cara de sua esposa. Adônis era só uma sombra! Não existia mais. Perséfone jamais falou nele novamente. E aquela maçã não era de sua esposa. Não sabia de onde ela viera. Hades foi cegado pelo ciúme. Em mais de dez mil anos de casamento nunca houvera uma briga, uma agressão, uma falta de cortesia. Nada, nada, absolutamente nada.

Não, para Hades, aquilo não poderia acabar daquele jeito. Não fora ele quem agredira sua esposa. Aquele não era Hades. Ele não era inseguro e Perséfone não era infiel. Cumpria sua palavra e o queria bem, apesar de não ser totalmente feliz compartilhando o comando dos infernos. Fora o destino que os unira naquele lugar.

E quantos a Zeus? Ele teve a ousadia de lançar-lhe um raio?! Hades jamais se opusera a qualquer deliberação do soberano do Olimpo – até porque nada que viesse do Olimpo lhe interessava. Outrossim, jamais invejara o irmão famoso, ajudou o caçula a derrotar inimigos como Cronos e os titãs, bem como Érebo e tantos outros. O inferno sempre fora um anexo e ao mesmo tempo um ponto de apoio do Olimpo. Muito das luzes que havia no Olimpo tinham origem ali, no Hades, nas trevas.

Ingratidão!

Zeus deveria pagar por ter levado a afeição, o amor e a paixão de Hades, talvez a única razão de viver daquele deus soturno. Vingança! Guerrearia até ter de volta aquilo que nunca deveria ter saído de sua vida… ou entrado?

Além disso, segundo Hades, havia muitas particularidades de Zeus que incomodavam os demais deuses e que não tornavam eventual conflito impossível.

Do alto de sua arrogância e prepotência, Zeus achava-se intocável e inabalável, o centro das atenções, o pai de todos. Governava de modo personalista, baseava-se em acordos e promessas. Valia-se de um código moral que não era escrito e que, por isso, não era certo ou seguro e que poderia variar de acordo com os desejos, anseios e necessidades da super estrela olimpiana. Apesar de sempre dizer que governava para todos, era notório que suas ações visavam mantê-lo no poder. Zeus gostava de ser cortejado e consultado. Adorava quando lhe perguntavam se estava tudo bem com ele. Poderia ser até uma questão estúpida e irrelevante para os desígnios das divindades, mas ele gostava de palpitar. Quando entediado problematizava qualquer questão simplória. Poderia mesmo ser um problema banal como a colocação de uma mesa ou de uma cortina neste ou naquele lugar, mas ele fazia questão de chamar inúmeras pessoas para discutir por horas a fio o melhor lugar. Fazia vários testes, considerava a hora do dia, a posição do Sol, a iluminação, a opinião de várias pessoas. Todos ficavam muito cansados quando Zeus estava “atacado”. Apesar de Hera ser considerada uma víbora, uma vaca e uma vadia por quase todos os habitantes do Olimpo, ela tinha a qualidade de ser pratica e objetiva para resolução de problemas pontuais, domésticos ou mesmo da administração do monte. O comportamento muitas vezes confuso de Zeus às vezes se estendia para questões importantes e, embora fosse um exímio político, desgastava seus pares de forma desnecessária. Normalmente já tinha as respostas às perguntas que fazia ou que lhes eram feitas, mas queria ouvir a opinião alheia, embora nem sempre prestasse atenção nelas. Por outro lado, quando mal humorado ou simplesmente desanimado, pois o humor de Zeus era muito variável, resolvia qualquer questão de forma incontinenti e não tolerava muitos questionamentos. Ficava impaciente. Assim, apesar do governo forte e eficiente do marido de Hera, o dia a dia era maçante e imprevisível. Nunca se sabia quando seria a próxima briga “forte” de Zeus e de Hera, por exemplo. Nunca se sabia se Zeus daria um tempo ou convocaria de uma hora para outra dezenas de deuses, pessoas, assessores, centauros e etc.

Muitos estavam cansados dessa instabilidade emocional de Zeus, que tendiam a aumentar nos períodos de paz e nos períodos que o dono do Olimpo estava sem um caso novo para descontrair. Queriam regras claras. Formas de deliberação, maior participação na política, formas de cobrar as promessas do deus supremo. Não que ele não as cumprisse, mas às vezes, elas demoravam para serem cumpridas, o que trazia embaraços.

Além disso, Zeus achava que Asgard também estava aos seus pés depois de tê-los ajudado a evitar o Ragnarok. Entretanto, muitos achavam que a soberba de Zeus o cegava.

Sem a ameaça dos Gigantes de Gelo, o que impediria os asgardianos de se voltarem contra os gregos? Era o que perguntavam alguns críticos de Zeus. A ação de Zeus não contou com a total aprovação dos deuses do Olimpo. Hera foi uma fervorosa opositora da empreitada. Héstia e Deméter também. Apolo e Ártemis foram contrariados para a guerra. Dionísio sumiu. Eos, Hélio, Selene, Prometeu, Pã, Quíron, bem como outros deuses e titãs menores se posicionaram contra a guerra. Hermes tentou dissuadir Zeus mais não conseguiu. Atena era contraria a guerra, mas acatou a decisão do pai, pois, afinal de contas, era a deusa da guerra. No entanto, a expedição vitoriosa foi feita e muitos dos que eram contrários a ela foram para o campo de batalha. Muitas criaturas, homens, heróis e semi-deuses morreram e a raça dos gigantes de gelo quase foi extinta, o que causava nojo a muitos no Olimpo, pois não queriam ser vistos como animais selvagens e cruéis, matadores de criaturas que nunca lhes fizeram nada, tal como no passado eram considerados os titãs. Temiam se transformar naquilo que repudiaram milênios atrás.

Enfim, a aliança com os asgardianos em muito desagradou os olimpianos. Alguns queriam que os nórdicos fossem exterminados mesmo, outros achavam que a mistura não daria certo e outros se sentiam desprestigiados, pois anos de lutas, confrontos e inimizades com os escandinavos foram jogados no lixo. Não havia consenso, mas tal dissenso ficava nas entrelinhas e só era manifestado na ausência do deus do trovão grego.

Os olimpianos sempre se sustentaram sobre o tripé Zeus, Hades e Poseidon e ainda tinham Apolo e Atena como deuses super mega foda poderosos. Muitos entendiam que não precisavam dos nórdicos e que poderiam dissuadir ou mesmo eliminar todos os outros panteões ainda que estes se unissem contra o Olimpo. A pureza olimpiana estava sendo perdida… Havia muita insatisfação entre os gregos, por diferentes motivos, e parecia que Zeus fechava os olhos para isso.

Tal conjuntura trazia muitos aborrecimentos, mas ninguém podia fazer nada, pois Zeus contava com o apoio irrestrito de seus irmãos: Poseidon e Hades.

Milênios atrás, Hera, Poseidon e Apolo lideraram um golpe de Estado que quase deu certo. Naquela época, como hoje, Zeus estava impossível e insuportável. Só que diferente daquela vez, há beligerância declarada entre dois dos três pilares do mundo grego. Não é uma conspiração como foi outrora.

O desrespeito para com os outros seres era enorme. Traía Hera a seu bel-prazer, desvirginava garotas inocentes as seduzindo, permitia que o grupo de ações táticas de Hera agisse livremente, matando amantes e prole inocentes. Zeus apenas se preocupava em se manter no poder.

Por fim, e um motivo a mais que surgiu na mente de Hades para legitimar seu espírito bélico é que ele não queria poder, prestígio ou o trono de Zeus, queria apenas Perséfone ao seu lado, mas dessa vez, por tempo integral, sem tê-la que dividir com a mãe. Quer causa mais legitima para guerrear do que o amor? Muitos no Olimpo, por um motivo ou outro, apoiariam Hades ou pelo menos se manteriam neutro. E neste ponto, o nome Poseidon surgia forte. Hades sabia que o irmão marinho não era feliz na condição de sombra de Zeus e que esperava uma oportunidade para mostrar independência. Poseidon se mostraria independente em relação a Zeus e não interferiria em uma eventual guerra entre o colosso do subterrâneo e o colosso do céu, afinal de contas é irmão de ambos e deve tratá-los de forma isonômica.

Depois de horas de pensamentos ásperos, cruéis e rancorosos, variando para momentos de fraqueza e arrependimento, beirando a depressão e buscando fundadas razões para sua vingança, Hades chegou a duas conclusões:

- Perséfone será minha rainha amada novamente e Zeus cairá! – afirmou convicto para si mesmo, mas… – Como será que ela está? Ela não aguentará muito tempo sem mim, nem eu sem ela. -  Disse com os olhos marejados e a voz marejada.

CONTINUA…

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